“Em vez de estar escrevendo isso, eu preferia estar produzindo um disco dos Ecos Falsos. Por quê? Porque quando eu fui ouví-los todo orgulhoso com a farinha da minha experiência, eles vieram com um bolo inesperado, e eu comi até mais do que queria. Esses profanos, esses agnósticos, esses heréticos são bons pra diabo!” Tom Zé Assistindo ao show do Ecos Falsos na sexta no Outs, fui obrigada a concordar com o mestre tupiniquim. Em meio a um clima descontraído, quase familiar, a banda abriu a apresentação com “Bolero Matador”. O troca-troca de instrumentos e o revezamento de vocais durante o show mostrou que os caras não se preocupam com a disposição padrão no palco e as diferenças gritantes entre as músicas refletem as variadas influências da banda. O público animado dançou ao som de “A revolta da musa”, “A última palavra em fashion”, a introspectiva “Reveillon”, que já concorreu ao VMB, e “Sobre ser sentimental” que lembra os melhores sons do “Lullabies to paradise” do Queens of Stone Age. A banda formada em 2002 por Gustavo Martins, Daniel Akashi e Felipe Daros nos vocais, baixo e guitarra e Davi Rodriguez na bateria, tem entre suas influências Frank Zappa, Queens of the Stone Age e Ultraje a Rigor, o que não podia dar resultado melhor. O jeito debochado dos caras e sua critica ao hype lhe renderam algumas dificuldades no início da carreira, mas foi justamente a crença no que fazem que o destacaram das bandas atuais. Aproveitamos o show que a banda fez no Outs, no último fim-de-semana, e batemos um papo com Daniel, Davi e Gustavo. Felipe tinha cortado o pé e apareceu na hora do show, por isso tocou sentado. Eles falaram um pouco sobre a cena indie, as participações de “Descartável vida longa” e prometeram material exclusivo para os fãs. |
Vocês estão pensando em lançar algo novo? Gustavo: Já fez um ano desde o lançamento do disco. Ainda tem muitos lugares que não tocamos. Vamos divulgar o disco até o começo do semestre que vem. Mas no fim do ano nós estamos trabalhando em duas surpresas. Um é presente mesmo e é de graça. Davi: A gente quer fazer um kit multimídia do Ecos Falsos. É coisa nova. Gustavo: É um EP surpresa que a gente vai fazer até novembro. Um presente pré-Natal. Podia chamar "Pré-Natal", né? Daniel: Não, aí vai soar meio Raimundos, tipo "Cesta Básica". (risos) Gustavo: Paralelo a isso estamos trabalhando no disco novo. Prometemos que íamos dar uma parada nos shows, mas ainda não conseguimos. Estamos pensando em largar o trampo só para tocar. Mas, acho que isso é um plano talvez para o ano que vem. Davi: Não acredito que estou ouvindo isso. Isso é muito mais primeira mão do que nosso kit de Natal. (risos) Gustavo: Se eu ganhar na loteria, até rola. O Davi não faz nada e o Felipe também desde que não corte o pé no caco de vidro como fez hoje. A gente pode virar só modelo de propaganda, que tem uma agenda menos afetada.
Coloca uns celulares pra ganhar grana com os clipes. Gustavo: Isso, vamos investir em merchandising. Podemos conversar com o Rick Bonadio, de repente o Rick tem uma proposta. (risos) Davi: Podemos também entrar numa comunidade de figurantes. (risos) Gustavo: Nós já estivemos na lista do Rick Bonadio uma vez. É uma história longa. Um amigo nosso estava na comunidade do Rick Bonadio, a comunidade só tem puxa-saco. O Bonadio entra nessa comunidade e fica falando, dando dicas. Ele ia fazer uma coletânea com as bandas, aí um cara me ligou e falou “cara, entra na comunidade finge que você já está faz tempo e manda uma demo de vocês, por que só tem banda ruim, assim não vai rolar a coletânea”, então entramos e colocamos uma música nossa. E nós tínhamos sido uma das bandas escolhidas, só que no fim das contas, chegava uma hora que tinha que pagar. Eles até lançaram depois pela Arsenal, devem ter prensado duas cópias pra cada banda. (risos) Por que essa era a lista de Deus... Tinha um post em que ele falava o que fazia uma banda dar certo. Aí eu entrei pra olhar e ele dizia assim, “pra eu escolher uma banda tem que ter talento, mas além de tudo tem que ser escolhida por Deus, tem que ter um toque divino.” No fim dava a entender que ele era Deus. (risos)
Em “A última palavra em fashion” vocês criticam essa onda hype e a galera que cultua tudo que vem de fora do país, os famosos enlatados. Gustavo: Quando você escreve uma letra, às vezes você quer dizer uma coisa e acaba dando outro significado. Quando eu escrevi “A última palavra em fashion” eu estava pensando musicalmente, tinha essa impressão da cena indie e de bandas nacionais. Era uma coisa de imitar modelos que estavam rolando em Nova York. Tinha uma época que a galera exagerava no Pixies, no Wezeer que eu adoro, mas era uma coisa que o pessoal gostava por estar rolando em NY e assim saiu o refrão: “Como assim? Você não viu? Se é bom pra Nova Iorque é bom para o Brasil” e representava um pouco nosso sentimento de outsider, sabe? Não ter o espírito muito reverente, somos mais irreverentes. Davi: A gente faz esse tipo de protesto, mas somos muito pop pra punk de protesto e somos muito protesto para ser pop. Gustavo: Tipo, esses dias está na onda do electro, aí todo mundo gosta de electro. Davi: Eu nunca disse para vocês, mas acho que essa podia ser uma música que o Dead Kennedys tocaria. Tipo de humor irônico e sarcástico. Gustavo: Mas, não é coisa que a gente leva tão a sério. Não adianta importar modelos para o Brasil. Esse nem é um país de roqueiro, é diferente, aqui o rock significa outras coisas. E isso é a idéia dessa letra, por isso escolhemos esse nome pro EP.
Como foi trocar o selo independente pela a Monstro Records? Gustavo: A gente realmente gosta o trabalho da Monstro. Fizemos o Goiânia Noise e fomos nessa, não queríamos ficar batendo em porta de gravadora, já tínhamos o contato. Eles pegaram uma cidade que vive do sertanejo e conseguiram criar um público legal lá, é muito bom o que eles fazem. Davi: É um selo coerente com o que estamos fazendo. Foi mais um lance de parceria, fazer essas coisas de divulgação que agente não tem muito tempo pra fazer. Gustavo: Nosso trabalho não mudou por causa disso, nós continuamos nos produzindo. Mas, eles resolvem coisas de direitos autorais e tudo mais.
Vocês trabalharam com a Fernanda Takai, com Sérgio Serra e com o Tom Zé. Qual a relação de vocês com eles e o que essas parcerias significam para a banda? Vocês sabem que tem gente que só usa esse tipo de participação para se promover. Gustavo: Bem, não é esse nosso caso. Até por que, cada participação teve uma história. A primeira é o Tom Zé. Atrás da capa do nosso EP tem uma frase do Tom Zé em que diz que ouviu e gostou muito. Eu entreguei a primeira demo de 2004 pra ele, fui em sua casa, ele sugeriu umas coisas para a música. Mas, quando agente falou de “A revolta da musa” ele adorou e gravamos. Ele tem muito a ver com o refrão: “Ó minha musa, isso não se faz, isso não se usa. Você sabe que um artista não se dá bem com a recusa”, se você ouvir a história do Tom Zé, ele foi de um tamanho ostracismo. Essa música fala do reconhecimento do artista. Ele cantando deu outro significado pra música. Já o Ultraje é uma banda que agente já gostava quando o Sérgio Serra viu um show nosso e curtiu bastante. Um tempo depois a gente organizou junto com o Rock Rocket um tributo ao Ultraje a Rigor e pedimos pra ele tocar. Ele gostou da idéia e ensaiou com a gente. Davi: E foi engraçado pra caralho por que na gravação a gente foi trocando idéia e quando chegou ao estúdio e fomos tocar, para testar a guitarra ele fazia uns solos...E foi uma coisa fascinante por que sempre ouvi Ultraje a Rigor e ver o cara gravando e perguntando se está bom é muito legal. A gravação acabou pegando uns 3 solos ao meso tempo. Já com a Fernanda Takai, a gente estava pensando em chamar alguma voz feminina pra um dueto e recebemos essa dica de um amigo. Mandamos um e-mail convidando e ela respondeu. Ela falou vamos fazer, manda a música. Para gravar fomos trocando e-mail, não nos encontramos. Mas, depois conversamos com ela em situações diferentes.
Uma coisa que é perceptível em vocês é que sempre estão buscando algo diferente do que existe na cena. Mas, vocês não têm medo disso virar um paradigma? De repente de exceção passar a ser regra? Davi: Não é que a gente é contra regra. Mas, na hora que a gente virar regra, a gente vai ser contra-regra e não vai achar ruim. Não é tipo “que merda, eu era diferente, agora as pessoas gostam de mim e eu não gosto mais de mim.” Gustavo: Eu acho que isso não é uma coisa que a gente se preocupa. Mesmo que a gente seja ou pareça diferente, no meu ver a nossa maneira de fazer musica não é tipo “olha esse disco, vamos fazer umas coisas que nem essa banda”. Para nós musica é presença, o que nós somos, o que a gente ouve, fala. Isso é a nossa música. Davi: É foda você deixar de ser o que é pra tentar se um outro. Gustavo: Então, para a gente não é uma questão de “eles tão fazendo isso vamos fazer outra coisa”. O que fazemos, para o nosso azar, não está na moda. Pode ser que uma hora esteja. Desde que não seja uma coisa como “ah, o Blink (182) é uma banda que todo mundo curte vamos fazer um som parecido, se vestir parecido, as menininhas vão adorar”, pode ser que isso te represente, mas é triste, né? Davi: Parece até que agente é meio control freak com as coisas, mas é o que fazemos e o que achamos que temos que fazer. Gustavo: Não digo que não tenhamos entrado nessa onda. Todas as primeiras músicas que eu fiz eram plágios do Foo Fighters, eu me ouvia e lembrava dos riffs deles. Mas, acho que é normal começar assim, eu gosto de banda que pelo menos tentae fazer o som deles. Davi: Não quer dizer que não gostamos de bandas que pareçam com outras, existe nessa viagem toda uma questão de gosto, não basta só ser diferente. O problema é que é tudo muito radical hoje em dia. Metal tem que ser metal, punk tem que ser punk, hardcore tem que ser hardcore. É natural do Brasil, a gente está muito acostumado a comer só, temos que parar e olhar um pouco. Gustavo: Nossa questão é da autencidade, o que mais me frustra é conhecer um som em que o cara está fazendo aquilo, mas não é a linguagem dele, não representa ele. Se você está fazendo aquilo por que é autêntico, sendo sincero vai ser coerente. Pode ser HC ortodoxo até, é bom se for a verdade dos caras. E se o som que nos representa virar regra, ótimo. A nossa regra é ser autêntico, se isso virar padrão maravilha, mas acho que nunca vai virar.
texto por Estefani Medeiros fotos por Felipe Costa e Eduardo Mazzoco |
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