$P Noi$e
Primeira noite do braço paulistano do Goiania Noise, maior festival independente do país, decepciona pelos altos preços e curtos shows. O festival aconteceu paralelamente em Uberlândia também.
The TORMENTOS + Black Mountain (Canadá) + The Flaming Sideburns (Finlandia) + Motek (Belgica) + Ambervisions (Brasil) + Black Drawing Chalks (GO)
Faz um tempo que o tempo em São Paulo está fechado. A cidade já é cinza por si só, e quando o céu também fica, as coisas ganham um tom de melancolia extrema. Fora dos horários de pico (quando de qualquer jeito é caos) a “Londres de neblina fina”, como disse Mário de Andrade há muito tempo, se esvazia com chuva. As pessoas se abrigam em suas casas e suas festas particulares confortam as animosidades da metrópole. Mas não há como dizer isso com plenitude: é onde tudo há, em qualquer momento, onde toda hora é hora.
Nesse feriado, quase um quinto da cidade (1,7 milhões) foi embora. São quatro dias pra colorir a cabeça. Quem não foi, corre pra aproveitar um cinema ou um parque, e tudo superlota. Menos quando chove.
Na sexta-feira, às 19 horas, a fila de pessoas na porta da casa noturna Eazy era comparável ao número de manobristas. As doze pessoas não configuravam bem uma fila: não fazia muito sentido se organizar em tão pouca gente. Os que vinham comprar ingressos esperançosos saíram felizes: ao contrário dos rumores que o site oficial do SP Noise chegou a desmentir no dia 12 de novembro, os ingressos ainda era muitos. As 19 e 20, um hora e tanto depois do que estavam marcados, os portões foram abertos e ao longe já dava pra ouvir que o show do Black Drawing Chalks já havia começado.
O SP Noise é o desdobramento paulista do Goiânia Noise, maior festival independente nacional com 14 edições. O Black Drawing Chalks foi formado depois, influenciado pela primeira geração do rock goiano (MQN, Motherfish). A cartilha do rock goiano é seguida risca: seco e direto, regidos pela frenética bateria de Douglas (do coletivo artístico bicicleta sem freio, responsável por grandes cartazes e capas de discos do independente nacional, como a do Macaco Bong e do Super HiFi).
Certa vez durante uma palestra, o jornalista e critico musical Pedro Aleixo (Carta Capital) disse que “discordava do beneficio do jornalista não ter de pagar entrada, mas como jornalista, usufruía desse sistema”. Se a imprensa musical fosse idealista, o pequeno público do primeiro show seria reduzido a metade. As músicas da única atração goiana empolgavam quando os vinte minutos destinados à banda se esgotaram. Um bom show de abertura, rápido demais.
Alguns minutos de intervalo entre os shows e uma passada pelo bar constatou que não eram caros só os ingressos, com os preços entre 55 e 80 reais por dia (inacreditáveis em paralelo ao resto dos festivais brasileiros). As cervejas custavam cinco reais. Normal para os padrões das casas noturnas de São Paulo. Astronômico para um “festival independente” patrocinado por uma marca de cerveja. Somando o frio, a iminente chuva, a garganta já pedindo um chá e cama e os dois dias que faltavam pro feriado terminar, o resultado foi passar a balada sem beber. O padrão Monstro Discos foi seguido: dois palcos, bar e barracas de discos e camisetas. O espaço tinha até uma fonte com luzes coloridas na parte aberta, entre os dois ambientes da festa, que ajudava a dar um tom “hype” ao festival.
Quando o The Tormentos (ou Los Tormentos, como são conhecidos na Argentina) entrou no palco, com todos os integrantes uniformizados, sentiu-se que aquela era a melhor chance da noite de dançar. O show foi curto como o primeiro e o publico não era tão grande também, mas a empolgação e o carisma do baixista Marcelo contagiaram quem se propôs a sacudir os ossos com a surf music do grupo. Na edição goiana deve ter sido interessante o encontro da banda com os sãocarlenses Dead Rocks.
“Oito horas é cedo pra São Paulo né?” disse o baixista ao Escarniando. Na quarta passagem pelo Brasil com os Tormentos (e outras quatro com a antiga banda de punk rock), Marcelo lamentou o pequeno publico. De fato as 20 horas e com ingressos tão caros, numa sexta-feira em meio a um feriado, foi quem estava muito disposto mesmo. Marcelo ficou espantado com o preço dos ingressos “É de se chorar. Mas é mais uma noite de rock! E isso sempre vale a pena!”
Faz um tempo que o tempo em São Paulo está fechado. A cidade já é cinza por si só, e quando o céu também fica, as coisas ganham um tom de melancolia extrema. Fora dos horários de pico (quando de qualquer jeito é caos) a “Londres de neblina fina”, como disse Mário de Andrade há muito tempo, se esvazia com chuva. As pessoas se abrigam em suas casas e suas festas particulares confortam as animosidades da metrópole. Mas não há como dizer isso com plenitude: é onde tudo há, em qualquer momento, onde toda hora é hora.
Nesse feriado, quase um quinto da cidade (1,7 milhões) foi embora. São quatro dias pra colorir a cabeça. Quem não foi, corre pra aproveitar um cinema ou um parque, e tudo superlota. Menos quando chove.
Na sexta-feira, às 19 horas, a fila de pessoas na porta da casa noturna Eazy era comparável ao número de manobristas. As doze pessoas não configuravam bem uma fila: não fazia muito sentido se organizar em tão pouca gente. Os que vinham comprar ingressos esperançosos saíram felizes: ao contrário dos rumores que o site oficial do SP Noise chegou a desmentir no dia 12 de novembro, os ingressos ainda era muitos. As 19 e 20, um hora e tanto depois do que estavam marcados, os portões foram abertos e ao longe já dava pra ouvir que o show do Black Drawing Chalks já havia começado.
O SP Noise é o desdobramento paulista do Goiânia Noise, maior festival independente nacional com 14 edições. O Black Drawing Chalks foi formado depois, influenciado pela primeira geração do rock goiano (MQN, Motherfish). A cartilha do rock goiano é seguida risca: seco e direto, regidos pela frenética bateria de Douglas (do coletivo artístico bicicleta sem freio, responsável por grandes cartazes e capas de discos do independente nacional, como a do Macaco Bong e do Super HiFi).
Certa vez durante uma palestra, o jornalista e critico musical Pedro Aleixo (Carta Capital) disse que “discordava do beneficio do jornalista não ter de pagar entrada, mas como jornalista, usufruía desse sistema”. Se a imprensa musical fosse idealista, o pequeno público do primeiro show seria reduzido a metade. As músicas da única atração goiana empolgavam quando os vinte minutos destinados à banda se esgotaram. Um bom show de abertura, rápido demais.
Alguns minutos de intervalo entre os shows e uma passada pelo bar constatou que não eram caros só os ingressos, com os preços entre 55 e 80 reais por dia (inacreditáveis em paralelo ao resto dos festivais brasileiros). As cervejas custavam cinco reais. Normal para os padrões das casas noturnas de São Paulo. Astronômico para um “festival independente” patrocinado por uma marca de cerveja. Somando o frio, a iminente chuva, a garganta já pedindo um chá e cama e os dois dias que faltavam pro feriado terminar, o resultado foi passar a balada sem beber. O padrão Monstro Discos foi seguido: dois palcos, bar e barracas de discos e camisetas. O espaço tinha até uma fonte com luzes coloridas na parte aberta, entre os dois ambientes da festa, que ajudava a dar um tom “hype” ao festival.
Quando o The Tormentos (ou Los Tormentos, como são conhecidos na Argentina) entrou no palco, com todos os integrantes uniformizados, sentiu-se que aquela era a melhor chance da noite de dançar. O show foi curto como o primeiro e o publico não era tão grande também, mas a empolgação e o carisma do baixista Marcelo contagiaram quem se propôs a sacudir os ossos com a surf music do grupo. Na edição goiana deve ter sido interessante o encontro da banda com os sãocarlenses Dead Rocks.
“Oito horas é cedo pra São Paulo né?” disse o baixista ao Escarniando. Na quarta passagem pelo Brasil com os Tormentos (e outras quatro com a antiga banda de punk rock), Marcelo lamentou o pequeno publico. De fato as 20 horas e com ingressos tão caros, numa sexta-feira em meio a um feriado, foi quem estava muito disposto mesmo. Marcelo ficou espantado com o preço dos ingressos “É de se chorar. Mas é mais uma noite de rock! E isso sempre vale a pena!”
E ai o Noise realmente apareceu. O show do Ambervisions fez do palco pequeno uma caixinha de tortura auditiva. A linha do surf music continuou, mas a vertente surf music cavera pouco tem a ver com a tradicional dos Tormentos: uma fusão de surf music com o hardcore e trash. Com o rosto enfaixado como uma múmia e óculos escuros, na bateria Zimmer se distinguia dos demais, uniformizados de camisa preta e com medalha no pescoço. A bandeira do Avaí, recém promovido à primeira divisão do campeonato brasileiro, figura em cima de um amplificador. O primeiro indício de que o show não seria foi quando o vocalista e guitarrista Ameixa rodou com a guitarra e arrancou o fio do amplificador. Duas músicas depois, o mascarado Zimmer entregou a bateria, pegou duas maracás pretas e assumiu os vocais.
“Boa noite SP Noise. Nós somos o Black Montain. Nós somos o Broke Black Montain.” Depois disse algo sobre o segredo da múmia, que soou engraçado com aquela máscara; os catarinenses tem certo fascínio pela cultura trash em geral (em especial pelo filme Pink Flamingos, de John Waters). Era curiosa a coicidencia entre a cruz branca de ponta cabeça nas costas da camisa preta de Zimmer e as cruzes pretas nas paredes cinzas da linha de trem Diamante, que fica bem atrás da Eazy. Por alguns quilômetros na extensão da linha, em curtos intervalos, devem ser centenas dessas cruzes. Essa simetria era tão macabra quanto a inquieta performance do vocalista (responsável também pelo projeto de noise intitulado Abesta).
Simulou punhetas e mímicas indecifráveis, molhou com cerveja os fotógrafos que se aglomeravam na beirada do palco, batia forte de costas na parede de puffs empilhados ao lado do palco. O som alto deixou tímpanos doendo. Quando desceu do palco, o publico ficou apreensivo, esperando qualquer coisa da múmia. Ela apenas distribuiu afagos e abraços antes de voltar ao palco e se deitar no chão. Ameixa mal conseguia conter o riso e cantar, enquanto a múmia deitada no chão cantava “viva! Viva! Viva a sociedade alternativa”. O ultimo a permanecer no palco quando o show acabou era o baterista, que continuava a bater nos pedaços da bateria desmontados pelo chão e alguém gritou “Valeu Black Montain”. De fato, o show mais performático do festival, daqueles que fazem valer o ingresso.
No show em Goiânia, o Ambervisions recebeu o troféu de maior banda noise do mundo. Em São Paulo, roubaram a cena do primeiro dia. Desnecessários ou não, a banda se diverte com a imprevisibilidade dos seus integrantes, até pra eles mesmos. Depois do show dos catarinenses, os outros soaram estranhos demais pra serem absorvidos. A psicodélia do Motek suavizou os ouvidos, o Flaming Sideburns agravou a dor de cabeça e o Black Montain original fez um show bem morno. O dia seguinte encheu um pouco mais, mas ver o Porcas Borboletas no Sesc Pompéia (no coberto) fez valer a escolha. O independente nacional (o de verdade) não deve e não devia temer as bandas de fora.
Texto por Pedro Pracchia. A foto é roubada da Rolling Stone.
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